8 de Julho de 2014: Um banho de humildade

Naquele dia a bola não foi o ópio do povo, a equipa perdeu, o público vaiou e o estádio diminuiu. O país, outrora grande, achou-se pequeno...

Naquele dia a bola não foi o ópio do povo, a equipa perdeu, o público vaiou e o estádio diminuiu. O país, outrora grande, achou-se pequeno. O jogador, o herói de tantos anos, virou o maior vilão de toda uma vida. Para todos, aquilo resumia a história: nasceram para viver aquele fracasso. O inferno tinha descido à Terra e Deus deixava de ser brasileiro. O samba perdeu o ritmo e o pé o seu chinelo. A lágrima misturava-se com a raiva e a vergonha do mundo era descomunal. O todo poderoso Brasil, na sua casa, tinha sido esmagado num jogo que já conhecia de cor. Havia pior que isso?


Tudo se deveu à bola ter entrado vezes de mais na baliza errada. Aos adversários terem jogado o jogo da vida deles. Logo naquele dia, quando o povo saiu à rua. Tudo se resumiu à falta de sorte – a merda do azar – ao fracasso, à falta de qualidade, à ausência de talento. Ao excesso de confiança. À fugosa vontade de ser Hexa. Resumindo, não conseguiram fazer o básico, o mínimo, salvar o mundo do abismo e tirar a nação da miséria. Perderam porque alguém foi muito melhor, mas neste maldito jogo ninguém quer saber dos outros. 

E achamos sempre que não há ninguém superior ao Brasil. 

Eles precisavam da vitória, queriam ganhar e só vencer interessava. A derrota matou-os. A goleada humilhou o que restava. E as novas gerações cresceram sem o mito das anteriores: o Brasil não é o que de mais sagrado existe - Pelé, Ronaldo, Zico e Sócrates, onde quer que estejam, abanam a cabeça por esta altura. Eu e outras gerações mais velhas franzimos o sobrolho. Custa ler isto.

Naquele dia, enquanto o maior vilão da história tirava a camisola e limpava as suas lágrimas, o mundo à volta ruía. E cada adepto, do alto da sua ira, era engolido por uma lava quente de infelicidade. Eles foram humilhados, tudo deram mas nada conseguiram. Depois da bola parar, rolaram as cabeças. Naquele dia, o chão foi um mar de lamentos e a tempestade um ruído de impropérios.


Um a um, todos passaram pelo corredor da vergonha. E lá se ajoelharam emocionalmente, enquanto aquelas pernas cansadas e tremidas carregavam um corpo exausto. Aquele foi o dia em que viram a morte perder a vergonha. Em que a terra sagrada voltou a ser violentada por uma civilização forasteira, e uma nova bandeira se ergueu naquela terra prometida.


Tiago Carvalho.

You Might Also Like

0 comentários